Ruan entrou e sentou na poltrona como se fosse à primeira vez, tudo vinha dando certo até então, conseguiu chegar no horário exato de embarque, todos os entraves que poderiam atrapalhar sua viagem ficaram pelo caminho, estava tudo como o planejado.
Saindo da cidade não desgrudou da janela, aquele poderia ser o último registro de um lugar que conhecia bem. Usava calça jeans com um short por baixo, assim evitava ocupar o espaço precioso da mala com um jeans grande e pesado, ficou só de short e começou a conversar com o passageiro de trás.
Logo soube de toda a história do senhor de trás, estava acompanhado de mulher e duas filhas pequenas, duas lindas crianças loiras, não que a cor dos seus cabelos as tornassem mais bonitas, tudo naquelas garotinhas era lindo, o tipo de filha que todo pai queria ter. Eram simples e educadas, sorriam todo o tempo apesar da viagem cansativa, estavam vindo do Tocantins e iriam ate uma cidadezinha de Santa Catarina visitar á avó.
O homem assim como o resto da família era também simples, via se que não teve muitas oportunidades na vida, a escola lhe faltou, porém isso não o tornava rude ou sem assunto, existem certas pessoas que por mais que a vida tente os fazer desiludidos ou embrutecidos ela não consegue. Aquele homem do campo lhe inspirou muita fé e confiança, tudo que precisava para a nova vida que viria a seguir.
Cada pessoa tinha uma história muito interessante, era engraçado. Lembrava-se de uma coisa que sua professora falava e que não concordava, dizia nas aulas de literatura “Olha só, vocês tem boas histórias, isso poderia dar um bom livro ou até mesmo um filme” Sempre acreditou que ter boas histórias era o mínimo do mínimo, o que fazia uma obra boa ou não, era mais a forma de contar assim como os recursos utilizados do que a história em si.
Do seu lado dois rapazes falavam de um acidente que haviam presenciado em outro Ônibus vindo de Mineiros, uma cidadezinha no interior de Goiás, especulavam o numero de vitimas, os mortos e os feridos, para quem iria viajar mais de vinte e quatro horas pela primeira vez, a historia dos passageiros do lado não era muito cômoda.
Sabia que estava ali para o que der e vier, e que se algo acontecesse, com certeza não seria com ele, a tranqüilidade com que os rapazes contavam a historia passou coragem, e ele tentava tirar de cada acontecimento ou pessoa algo que pudesse ajudar na sua nova trajetória, agora mais do que nunca, não havia tempo e nem espaço para errar ou ter medo.
Ouviu tudo o que disseram e fez assim o perfil dos que estavam próximos, não podia confiar em ninguém e ao mesmo tempo precisava saber com quem contar em um momento de precisão, analisava as coisas mais ínfimas em cada passageiro, pegou então o único livro que havia levado: Maquiavel O Príncipe, bem oportuno pra tudo o que viria pela frente, leu por muito tempo até dormir enquanto o ônibus atravessava o cerrado do sul de Goiás.