Há se tivesse acordado antes daquele sonho individual, solitário e auto-suficiente acontecer. Há se tivesse percebido que somos completos e imperfeitos ao mesmo tempo, que nada se basta sozinho.
As fachadas na cidade, as pixações. Pequenas histórias, pequenas mensagens, um pouco de expressão, um pouco de poesia. A particularidade que abarca um todo, um todo construído de particularidades.
Na vitrine de uma loja havia uma lagartixa, uma dessas pequenas histórias, a historia do pequeno réptil. Os carros passavam, as pessoas passavam, e a lagartixa intacta na vitrine. Será que alguém á viu ? Se viu não matou, e assim ela vai vivendo na vidraça, anônima no centro da cidade.
Talvez sejamos também anônimos, alheios ao universo, talvez sejamos universos particulares e interdependentes. Escrevo diante da janela, na frente da rua, pessoas passam a todo o momento, carros, motos e bicicletas vem e vão. Talvez eu esteja na vidraça esperando algum inseto.
O mundo acontece nos murros, nos sorrisos, nas placas, no barulho do vento, como fragmentos de uma enciclopédia sem fim. As coisas se dependem para existir, a pessoalidade acontece em meio à universalidade.
Depois de tanto caminhar só pude perceber que estava tudo ali, bem na minha frente, uma conclusão óbvia! Conclusões óbvias são difíceis de entender, e até mesmo de acreditar. Como quando descobriram a lei da gravidade por causa de uma maçã.
Um outro ângulo irradia tudo agora, é como deixar de usar uma corrente nos pés, ou retirar os óculos escuros em um dia de muito sol, como na história daquele mito, ainda vivemos em cavernas.
Acontece primeiro o susto, os pés que já estavam acostumados com a dor da corrente demoram a se adaptar á liberdade, e a retina que quase não via luz se dilata no momento da retirada dos óculos, você se torna cego de uma vez ou talvez um louco que não queira ver o que ô cerca. Poucos enxergam depois de ver o sol forte, a coragem de vencer uma crença é escassa, difícil de alcançar, melhor para os homens enfrentar uma guerra sem sentido, levar um tiro e morrer por uma ilusão á retirar o véu que encobre os ideais forjados.
Os novos sentidos adquiridos aos poucos enquanto a pupila dilata, são difíceis de serem explicados, muito diferentes de uma explicação comum, é tão mais fácil viver em um mundo particular e continuar como sempre, com crenças comuns de não precisar de nada alem de si mesmo. O que há agora não é um egoísmo triunfante, é a vontade que compete para o bem de tudo, é uma lógica sensitiva, se é que isso existe. A luz não se compõe sozinha, ela acontece se conseguir se infiltrar em todos os cantos.
A importância das pequenas coisas, dos pequenos milagres, a coragem de acreditar em sonhos, a atenção com algo mais alem da ponta do nariz, é a engrenagem que faz continuar, que não se deixa alienar. Se antes era uma parte desconexa de um todo, agora entendo o processo, ou melhor, sinto o processo. É só fazendo parte do processo que se torna o todo, que se constrói algo, observando as janelas e as lagartixas.
São outras as realizações agora, não que aquelas antigas não aconteçam mais, a diferença está na importância de cada elemento, em saber o que buscamos e porque buscamos.
Não digo para deixar de lutar, de correr atrás dos objetivos, dos sonhos... Afinal esse é o sentido único de viver - buscar os sonhos.